Por: Marcio Alves
Ontem à noite, bem dizer de madrugada, na calada da noite, me venho pela segunda vez a sensação como uma ideia súbita que ganha cada vez mais força, de uma metáfora para minhas angustias: de um vampiro, mas não um simples vampiro...um vampiro angustiado...e isso no sentido de ver as horas da madrugada passarem rapidamente, de perceber meu quarto aos poucos estar sendo invadido pela intrusa luz do sol, desejando ardentemente, por não ter dormindo nada, que o dia se transformasse em noite, e que a noite fosse eterna.
Ultimamente não tenho conseguindo entender e suportar a ver a alegria e bom humor das pessoas, desejando muitas vezes sugar tais sensações ou aparências, como um verdadeiro vampiro que chupa se alimentando como se isso fosse sangue. Me sinto como se estivesse em uma corrida indo na contramão da multidão, me sentindo um verdadeiro patinho feio, dançando uma música diferente do que as pessoas estão dançando. Talvez isso porque o que dizem é a verdade: de que a beleza está nos olhos de quem vê...com meus pobres olhos de angustia só consigo ver angustia ou como um vampiro que só tem uma única necessidade: de beber sangue! Sangue de alegria, bem-estar e saúde mental.
Aliás, a alegria e a luz do dia são duas coisas que para mim são pesadas, indigestas, “escuras” por assim dizer, de serem olhadas e percebidas a minha volta. Que me ferem, me machucam. Assim como a luz cega o vampiro, a luz tem me “cegado” de dormir...ou de tentar dormir mais...sempre um pouco mais...a vontade que tenho as vezes é de me trancar no quarto, apagar todas as luzes, fechar as janelas, e com uma pesada cortina fazer escuridão no lugar da claridade do dia, pois o pior momento nas 24 horas é justamente o dia, mais especificamente, de manhã, e com ela a dura realidade que me convida a sair da cama e encarar mais um dia literalmente.
Voltando ao tentar e se esforçar por apreender – literalmente “apanhar, pegar” – toda essa alegria a minha volta, das pessoas que me rodeiam, estava ontem mesmo na faculdade – sim, estou numa verdadeira luta comigo mesmo para voltar a minha rotina, a me reerguer – e na sala, quando o professor fazia gracinhas, contando o que me parecia ser uma piada, e meus colegas davam boas e gostosas risadas, eu lá, no meu canto, serio, em silencio tenebroso, contemplativo, observando e pensando nessa alegria e bom humor das pessoas.
Foi nesse momento que me veio pela primeira vez a metáfora da angustia como vampiro - a segunda de madrugada. Me imaginei sendo naquele momento um vampiro pulando no pescoço das pessoas e sugando de suas almas que me parecia vivas, essa alegria e bem-estar, para assim, quem sabe, conseguir literalmente introjetar (“colocar para dentro”) – jargão psicanalítico – essa vibrante e colorida alegria. Como gostaria que essa alegria fosse contagiante, que me pegasse de jeito...mas me parece ultimamente, que a alegria de vez em quando, me pega, assim “do nada”, de repente. Adoraria que essa alegria toda fosse possível de ser “mordida”, “chupada”, “comida” e “engolida”, como um verdadeiro liquido sagrado, um elixir da vida que me desse vida.
Sei que é triste viver assim – prefiro pensar “estar assim”, no sentido de ser por um momento – mas também não posso negar essa vivencia, essas sensações, por pior que sejam, por mais assustadoras, mesmo que me dê a angustia de se ver como um vampiro. O “não posso” aqui não quer dizer que não queira. Por mim já estaria junto com as pessoas rindo não sei do que, feliz não sei para que, principalmente o dormir bem e acabar de vez com essa insônia...ah isso sim eu sei para quê e porquê rsrs. O sono verdadeiramente é um alimento para o corpo, mente e a alma. Uso, inclusive aqui, o sangue como metáfora para o sono.
O pior de tudo não é a angustia em si, nem a inveja daqueles que dão risadas e dormem bem a noite, pois não sei o quanto e em que grau pode ser verdadeiro, principalmente essa necessidade de se mostrar feliz – necessidade esta, não apenas em ter que parecer feliz para os outros, mas principalmente, por as vezes, tentar se auto enganar. Mas como estava dizendo...o pior de tudo quando se sente um vampiro angustiado é se sentir frio, indiferente a vida, a alegria e beleza de viver. É ver justamente a alegria nas pessoas e ficar tentando adivinhar se aquela alegria existe mesmo e por qual razão ou se é apenas aparência.
Na verdade, falei da pessoa que muitas vezes, alegre, dando risadas, que poderiam estar se auto enganando-se, mas no fundo o meu medo como novamente angustia é por pensar que o auto enganado nessa história toda seja apenas eu, que mergulhado na angustia que me faz ver tudo “preto e branco” não consegue perceber o colorido que o mundo também tem e que as pessoas muitas vezes conseguem vislumbrar e se alegrar com tal beleza colorida.
Nesse caso, o doente sou eu, quem está com defeito nos olhos sou eu...ou será que o “único” com visão lúcida e clara da vida seja eu nesse momento de angustia? Sinceramente não sei...essa é uma pergunta difícil de responder ou que talvez nem tenha uma única e verdadeira resposta...pode ser – e que agora em quando escrevo esse texto é que me saltou de repente essa ideia, como um pássaro livre que voa, pois assim também são as ideias as vezes: livres – retomando...pode ser que a vida tenha vários lados e significados, como se fosse um tapete ou uma moeda que haja lados opostos e diferentes.
Bem, na verdade essa metáfora é muito pobre para a vida que acabo de se chegar... uma frágil e temporária conclusão que pode me salvar desse pessimismo e angustia de enxergar a vida: a vida é muito mais complexa e rica, e está para além dos óculos que usamos para a enxergar. Quem sabe o vampiro angustiado aqui, ainda tenha salvação e consiga ao invés de querer sugar, roubando das pessoas – como se isso fosse possível rsrs – a alegria delas, consiga enfim voltar a se transformar em um ser humano, no sentido complexo e completo...mas quem disse que o vampiro também não é gente? Não sei também...o que sei é que quero voltar a ver o sol como o poeta e dizer como ele é lindo e desejado, sem medo de que com a luz venha morrer!